A culpa, o café frio e o calendário abarrotado
Se você é mãe e profissional, já deve ter ouvido essa pergunta silenciosa ecoando entre uma reunião e outra: “Será que estou sendo presente o suficiente?”
Spoiler: você está. Mais do que nunca, aliás.
A questão é: a que custo? Segundo estudos recentes, mães que trabalham hoje passam tanto tempo com seus filhos quanto as mães que ficavam em casa nos anos 1980. Sim, isso mesmo. Estamos no slack entre uma lição de casa e outra, mandando e-mails durante o treino de futebol e respondendo “só mais uma pergunta” enquanto descongelamos o jantar. A maternidade moderna virou uma operação de alta performance — e nós, as COOs da infância. Com playdates agendados, festas com inspiração do Pinterest e agendas coloridas o bastante para assustar qualquer membro de conselho.
A matemática que não fecha
A situação das mães hoje:
- Dormem menos do que os pais — em média, 17 minutos a menos por noite.
- Têm menos tempo para amizades, hobbies ou até silêncios.
- Estão fisicamente presentes, emocionalmente disponíveis e… mentalmente exaustas.
Enquanto equilibramos planilhas, prazos e provas de ciências, aprendemos uma lição dura:
simultaneidade não é o mesmo que presença. E performance constante cobra um preço alto: dos nossos relacionamentos e, às vezes, da nossa identidade além da maternidade.
A armadilha da parentalidade intensiva
Você conhece bem esse instinto: querer acertar tudo. Ser a mãe que educa, inspira, alimenta, cria e ainda faz o melhor penteado no dia do cabelo maluco. Chamam isso de parentalidade intensiva — a ideia de que amar nossos filhos exige estar 100% disponível, 100% do tempo. Mas a ciência já provou o contrário.
Crianças não precisam de perfeição — precisam de pais reais. Precisam de tédio, de autonomia, de pequenos conflitos que elas mesmas aprendem a resolver. Precisam de adultos que não estão sempre disponíveis, mas estão verdadeiramente presentes quando estão juntos.
Três pequenas revoluções possíveis
Se você se reconheceu até aqui, respira. Eu também. Como mãe de cinco, executiva e alguém que já esquentou o mesmo café três vezes antes das 10h, aprendi algumas coisas no caminho — e continuo praticando outras:
1- Blocos de presença protegida
Duas horas 100% com as crianças? Perfeito.
Mas depois, duas horas 100% para você (ou para o trabalho). Sem culpa.
2- Tédio com hora marcada
Uma tarde por semana sem tela, sem plano. Só criança + casa + imaginação.
É desconfortável no início. Depois, é libertador — para os dois.
3- Auditoria de vida adulta
Quando foi a última vez que você conversou com um adulto sem mencionar filhos, escola ou rotina?
Se a resposta for “faz tempo”, talvez esteja na hora de recalibrar.
Redefinir o “suficiente”
Talvez o verdadeiro desafio não seja fazer mais, mas redefinir o que é o suficiente.
Ser uma boa mãe não é estar disponível o tempo todo — é mostrar que amor mora na consistência, não na performance. É ensinar, com o exemplo, que mulheres têm carreira, amigos, vontades, silêncios e filhos — e que nada disso precisa se anular.
Então, em vez de perguntar “estou presente o suficiente?”, tente se perguntar: estou inteira quando estou presente? O que meus filhos aprendem quando me veem cuidando de mim? Onde estou me doando por amor — e onde estou só me cobrando por culpa? A resposta não está em uma agenda perfeita.
Talvez comece num café tomado com calma enquanto eles montam uma cabana de lençol sozinhos.
Porque, no fim das contas, mais do que o nosso tempo integral, nossos filhos precisam da nossa existência, em boas condições.
Vamos em frente!
Um beijo com carinho,
Anna









