O Segundo Parto: a chegada da adolescência


Lúcia Paschinelli
por: Lúcia Paschinelli
Psicóloga clínica especialista em relações familiares, adolescência e vínculos afetivos e mãe do Leonardo.
(foto: arquivo pessoal)

Um dia, ele se foi.
O meu filho criança.
Não pediu mais colo,
não chorou de sono,
nem melecou minhas roupas com as mãozinhas sujas.

Simplesmente… foi.

De repente, ele já não cabia mais embaixo da mesa da sala de jantar.
E não estava mais ali, fazendo birra por qualquer coisa.
Sem que eu percebesse,
os personagens que habitavam minha bolsa, o carro, o box do banheiro e a sala de TV
foram embora.
Partiram em silêncio, como se soubessem que sua missão havia terminado.
Não ouço mais a frase:
“só mais uma vez… a última!”
depois de uma escorregada no parque.
Nem assistimos o mesmo desenho pela milésima vez.
Aquele mini Homem-Aranha que me acompanhava pela casa…
sumiu.
E no lugar dele, apareceu um rapazinho.
Com um gosto musical divertido, uma voz que muda de tom, e um humor que às vezes escapa pela porta do quarto, agora sempre fechada.
Ele já poderia me carregar no colo, se quisesse.
E sou eu quem lembra:
“Tem mais gente pra comer, viu?”
em vez de implorar por mais uma garfada.
As mensagens de WhatsApp chegaram com outra voz.
Antes doce, agora firme.
Outras necessidades.
O mesmo amor.
Trocamos birras por viradas de olhos.
“Deixa eu dormir com você?” por “quero meu espaço”.
Medo do escuro, por necessidade de privacidade.
Ele nasceu de novo.
E eu pari outro filho.
Com o coração ainda saudoso do que foi,
mas apaixonado por quem acaba de chegar.
Porque ser mãe de um adolescente é passar por um segundo parto: sem dor física, mas com todas as emoções do primeiro.
E é também, talvez pela primeira vez, precisar escolher ser ponte.
Mesmo quando o impulso é virar muro.
Ser ponte entre quem ele foi e quem está se tornando.
Entre o colo que ele deixou e o espaço que agora exige.
Entre o amor que cuida… e o amor que solta.
É resistir à vontade de se ofender com a distância, e escolher compreender o silêncio.
É atravessar a dor da ausência de forma presente.
É ser farol, mesmo quando não encontra o olhar.
Ser mãe de um adolescente é entender que o amor muda de roupa, muda de linguagem, mas nunca deixa de ser amor.
Mesmo na ânsia de tê-lo só mais um pouco colado ao seu corpo,
abrace a coragem de soltá-lo como quem semeia uma terra fértil.
É o seu destino agora: ver esse amor caminhar com as próprias pernas.
E se você fizer isso com respeito, presença e verdade, o coração de vocês sempre estará ligado, por fios invisíveis, mas eternamente firmes.
Há muitas maneiras de acompanhar esse renascimento.
Encontre a sua, sem jamais acreditar que está perdendo algo.
Você esta assistindo, com os olhos cheios e bem de perto ao florescer de alguém que sempre será, em qualquer idade,
parte do seu ventre e do seu mundo.

Confie: ele volta.
Volta diferente.
Volta crescido.
Volta seu.
De outro jeito.
Mas volta.

  • Lúcia Paschinelli

    Psicóloga clínica na abordagem Analítica Junguiana, com mais de 23 anos de experiência, Lúcia é especialista em relações familiares, casais em reconexão, desenvolvimento emocional e orientação parental para a adolescência. Atua em momentos de transição e crise, facilitando a reconstrução de vínculos e o encontro com novas formas de convivência. Palestrante, mentora de mães e autora de conteúdos que unem ciência, escuta profunda e alma, Lúcia também é fundadora de uma ONG de proteção animal e mãe do Leonardo. Compartilha sua vivência real de maternidade e profissão com sensibilidade, bom humor e profundidade. Ela acredita que todo relacionamento pode ser ressignificado, desde que haja presença, coragem e escuta verdadeira. “O vínculo salva.”

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