A nossa primeira briga


Lúcia Paschinelli
por: Lúcia Paschinelli
Psicóloga clínica especialista em relações familiares, adolescência e vínculos afetivos e mãe do Leonardo.

Talvez, ao ler esse título, a primeira coisa que venha à sua cabeça seja: “Nossa, ela nunca brigou com o filho?” Vou dizer para você: não. Tudo que vivemos até agora, por ele ser criança, era eu “brava”, argumentando, e ele se defendendo do meu poder materno.

Agora, em plena adolescência, foi diferente. Eu precisei me posicionar e deixar claro que o amor precisa de cuidado e, principalmente, de troca. Sem isso, não temos amor; temos outras coisas, como submissão, talvez, mas não amor.
Que duro, ter que colocar limites para uma pessoa que morou dentro de mim e, por muito tempo, fomos uma coisa só.

Que dor senti ao não poder ser colo no dia em que alguém o machucou — no caso, eu mesma.
Sim, eu o machuquei, sem a intenção de feri-lo, mas com o propósito de fazê-lo entender que ele não pode fazer o que quer, em lugar nenhum, e que essa aprendizagem precisa começar em casa.

Ontem eu acreditava que educar um filho não me quebraria por dentro. Afinal pensava eu, que o amor era um lubrificante que impedia que as engrenagens se quebrassem. Mas, hoje, com um amargo na boca e um nó na garganta, descobri que um filho se educa com perdas, ganhos, quebras e consertos. Esse lubrificante chamado amor, é na verdade um bálsamo que alivia as dores e com o passar dos dias, até cura.

O motivo foi até banal: mais uma divergência na hora do banho. Eu que pensava que essa fase tivesse terminado com a infância, me surpreendi, pois na adolescência, ela escalou para desrespeito. Então, eu precisei, fui obrigada pelo medo do mundo lá fora, que não o poupará em situações similares, me posicionar. Daí tivemos a nossa primeira briga. Pois nada justifica o seu desrespeito!

Criou-se um milímetro de distância entre nós que, para mim, pareceu milhares de quilômetros. Mas isso teve a intenção de mostrar a ele que o primeiro cuidado para manter o amor é o respeito.
Doeu em mim, doeu nele. Crescer dói, não é? Ele, literalmente, como ser humano, e eu como mãe, agora oficialmente mãe de um adolescente.

Fiquei dias procurando chão, buscando o olhar apaixonado que ele sempre teve por mim ao longo desses 13 anos, e não encontrei. Senti raiva… não a raiva de cinco segundos da mãe de criança, mas uma raiva nova, que durou enquanto eu não soube dissolvê-la. Ela me envenenou. Procurei antídoto no “mamãe, vem deitar comigo”, no “mamãe, eu te amo” ou no sono profundo aconchegado no meu colo, mas ele não estava lá. Precisei buscá-lo dentro da nossa história e na certeza de que o amo, como amo esse ser que está maior do que eu, mas ainda cabe dentro de mim.

Descobri, na prática, que ser mãe de adolescente é completamente diferente de tudo que vivi até aqui. Essa nova fase traz os mesmos desafios da infância, mas sem a ingenuidade que habitava nela.

No meio de toda essa tempestade emocional, percebi que a briga também foi um rito de passagem. A nossa primeira ruptura marcou o início de um novo tipo de vínculo, onde já não sou mais a mãe que resolve tudo por ele, mas a mãe que o ensina a se sustentar nas próprias pernas, mesmo que isso nos cause dor. Essa distância que doeu tanto é também o espaço necessário para que ele cresça e se descubra.

Hoje sei que o amor verdadeiro não é aquele que nunca enfrenta conflitos, mas o que consegue atravessá-los e permanecer. O que nos sustenta não é a ausência de brigas, mas a presença da certeza de que, por trás de qualquer limite, existe um amor inquebrável. Nesse amor, eu sigo, às vezes firme, às vezes frágil, mas sempre inteira, mesmo que colada nele, para ser a mãe que ele precisa.
Ontem após buscá-lo em um dos tantos lugares, vi entrar no carro um rapaz grande, com uma voz grossa e entendi definitivamente que o meu menininho cresceu e que não tem mais volta. Admirada eu me apaixonei por ele de novo, como no dia que o vi o pela primeira vez.

  • Lúcia Paschinelli

    Psicóloga clínica na abordagem Analítica Junguiana, com mais de 23 anos de experiência, Lúcia é especialista em relações familiares, casais em reconexão, desenvolvimento emocional e orientação parental para a adolescência. Atua em momentos de transição e crise, facilitando a reconstrução de vínculos e o encontro com novas formas de convivência. Palestrante, mentora de mães e autora de conteúdos que unem ciência, escuta profunda e alma, Lúcia também é fundadora de uma ONG de proteção animal e mãe do Leonardo. Compartilha sua vivência real de maternidade e profissão com sensibilidade, bom humor e profundidade. Ela acredita que todo relacionamento pode ser ressignificado, desde que haja presença, coragem e escuta verdadeira. “O vínculo salva.”

Data da postagem: 2 de setembro de 2025

Tags: , , , , , ,

Vale a pena dar uma olhada na minha seleção de produtos incríveis e
serviços que facilitam sua vida de mãe ;)