“Mães que trabalham ainda se sentem culpadas”, diz diretora do projeto Com Licença

Mãe de Bel e Maria, Bia Siqueira se formou em Arquitetura e Administração e Marketing, trabalhou em diversas empresas de grande porte, mas, antes mesmo da primeira filha nascer, já notava um desequilíbrio na vida das mulheres que são mães e trabalham. “Via muitas delas se dedicando desenfreadamente ao trabalho, se desdobrando em mil pra atender a todas as demandas: chegar a tempo no trabalho, gerenciar o dia a dia do filho à distância, produzir, levar ao médico, e ainda, ser mulher de vez em quando. Sempre procurei evitar o julgamento. Eu só olhava e pensava: ‘algo me parece muito desequilibrado… Quando chegar a minha hora quero ter, pelo menos, opções'”.
Com essa ideia na cabeça, em 2008 nasceu o projeto que deu origem o documentário “Com Licença“, em parceria com Gui Abrunhosa, que fala sobre as dificuldades das mães atuais com a enorme carga de manter a carreira profissional e de serem boas mães. Conheça um pouco do projeto, que ainda não tem data de lançamento, na entrevista.
It Mãe: Como surgiu a ideia do documentário?
Bia Siqueira: Queria transformar as ideias que já tinha em algo que pudesse realmente fazer as pessoas refletirem e gerar uma discussão social em larga escala. Em prol das mulheres, em prol dos filhos e em prol da sociedade como quebra-cabeça completo. O filme não é só sobre licença-maternidade, nós abordamos 4 temas principais: grávida no ambiente de trabalho, licença-maternidade, licença-paternidade e a volta ao trabalho.
It Mãe: A mulher que trabalha ainda se culpa muito?
Bia Siqueira: A enorme maioria sim. Poucas são as mães que querem ficar integralmente com o filho quando chega a hora de voltar ao trabalho, e mesmo essas precisam lidar com sentimentos muito distintos. Na minha opinião, chega uma hora em que você precisa sair um pouco da bolha e respirar novos ares, mas cada mãe tem de saber quando é esse momento. O mundo ideal é que a sociedade esteja preparada para respeitar esse tempo. As mulheres sentem como se a sociedade estivesse lhe roubando o momento mais valioso das suas vidas. A culpa é criada socialmente, não deveríamos carregá-la.
It Mãe: Há mudanças significativas no cenário corporativo?
Bia Siqueira: Acredito que mudança significativa vai começar a acontecer se tivermos um aumento da licença-paternidade, o mínimo de seis meses na licença-maternidade e uma flexibilização da carga horária da mulher que está voltando da licença. Penso que 6 horas diárias por mais seis meses já seria uma mudança muito significativa. Mas a longo prazo, por que não a licença parental, onde pai e mãe podem partilhar a licença? O programa empresa cidadã foi uma vitória (que concede 6 meses de licença), mas acontece que somente as empresas no sistema de lucro real podem aderir, além de ser espontâneo, ou seja, a mulher e a empresa precisam querer.

It Mãe: E dentro de casa: ainda há desigualdade entre pai e mãe?
Bia Siqueira: Muita. Cada vez mais vemos pais se envolvendo na rotina com os filhos, sem dúvida. Mas, as tarefas domésticas, comprovadamente, ainda ficam em cima da mulher. O que acontece é que enquanto houver desigualdade dentro de casa, nunca haverá igualdade fora de casa, é uma conta que não fecha. A mulher acumula funções, e é irreal achar que essa é uma questão apenas da esfera profissional. A mulher que está sobrecarregada dentro de casa, nunca conseguirá estar no mercado de trabalho em pé de igualdade. Na minha opinião, muito mais importante do que qualquer coisa, é a sociedade dar ferramentas para que o pai possa estar mais em casa nesse momento. Daí outras mudanças podem acontecer.
Assista ao trailer do documentário: