Que mulheres quero ser além de mãe?
Desde que me tornei mãe, há dez anos, uma pergunta começou a me acompanhar: que mulher quero ser? Principalmente, para ser o melhor exemplo para minhas filhas. Mas essa reflexão sempre foi superficial, porque, sejamos sinceras, qual mãe tem tempo para se aprofundar em questões tão complexas?
Foi então que surgiu uma oportunidade única: passar dez dias longe de tudo, na China. Apesar da empolgação, o nervosismo me acompanhou até o último momento. Chorei na despedida, mas ao embarcar no avião, decidi confiar. Confiei no meu marido e na sua capacidade de lidar com minha ausência; confiei nas minhas filhas e no vínculo que poderiam fortalecer com o pai; e, acima de tudo, confiei em mim mesma.
Ali, em uma montanha no meio da China, sem contato com o “meu mundo” por mais de uma semana (inclusive sem celular), tive a chance de pensar profundamente sobre quem eu gostaria de ser. Mas percebi que antes de responder a essa pergunta, precisava descobrir quem eu sou.
E foi caminhando que encontrei respostas. Nas primeiras horas de caminhada, meus pensamentos estavam focados no presente: problemas a resolver, coisas que gosto e não gosto. Depois de algumas horas, comecei a refletir sobre as pessoas ao meu redor — família e amigos próximos. Foi só lá pela quinta ou sexta hora de caminhada que algo mágico aconteceu: as camadas mais profundas começaram a emergir.
Viajar sem a família por vários dias tem algo especial. Não há aquela pressão de maximizar cada minuto livre ou resolver apenas o urgente. Para acessar questões mais profundas é preciso tempo — muito tempo — e no meu caso, caminhar. Subindo os dez mil degraus da Montanha Dourada, fui me desconstruindo camada por camada. Reencontrei a mulher forte aos 25 anos enfrentando a perda repentina do pai; a destemida aos 19 anos mochilando pelo Brasil; e até a curiosa aos 29 anos aprendendo a se comunicar em outra cultura.

Nos dias seguintes, sozinha e sem obrigações, percebi que essas versões de mim nunca me abandonaram. Ao aprender Tai Chi às cinco da manhã ou adaptar-me a comer arroz no café da manhã e dormir em camas duras, redescobri minha determinação e flexibilidade — traços que sempre estiveram comigo.
Quantas mulheres habitam em mim! E então percebo como a maternidade pode nos fazer esquecer disso. Os filhos chegam e passamos a enxergar apenas uma versão de nós mesmas: exaustas, inseguras e sempre correndo contra o tempo. Nessas horas é essencial olhar para dentro e despertar essas mulheres adormecidas.
Hoje sei que ainda não descobri completamente quem quero ser, mas aprendi algo fundamental: todas as versões de mim estão aqui dentro — prontas para me ajudar a ser quem eu quiser.









