Como criar memórias afetivas (e por que isso importa)
— Mãe, o que é festa junina?
A pergunta da minha filha de 7 anos me pegou de surpresa. Eu, na idade dela, contava os dias para poder colocar meu vestido caipira, arrumar o cabelo em duas tranças e deixar que minha mãe imprimisse o lápis de olho nas minhas bochechas, criando sardinhas artificiais. Com o chapéu de palha na cabeça, eu já imaginava, a caminho da escola, as gincanas com direito a prenda, a fogueira que se acenderia no final do dia, enquanto eu comia um delicioso arroz doce.

Enquanto eu descrevia o cenário acima para minha filha, ela me olhava com curiosidade. Nascida e criada na Alemanha, a obviedade da maravilha das festas juninas não era tão óbvia para ela. Isso me fez refletir sobre a importância das tradições e seu papel na vida familiar.
Afinal, o que são tradições?
Quando eu era criança, domingo era dia de colocar as bicicletas dentro do carro e seguir até o Parque do Ibirapuera, em São Paulo. Eu e meu pai. Era um momento nosso. Pedalávamos uma volta inteira ao redor do lago e, sem falhar, parávamos na lanchonete para pedir um sorvete de chocolate da marca Chicabom. Era o nosso ritual, infalível, todos os domingos de manhã. Até hoje, essa lembrança aquece meu coração e acredito que, de alguma maneira, me ensinou a valorizar atividades ao ar livre, seguidas de uma boa recompensa.
Essa se tornou uma de nossas pequenas tradições familiares. As tradições familiares fazem isso: criam laços, fortalecem a identidade familiar, oferecem segurança emocional para crianças e adultos e se tornam deliciosas lembranças. Elas ajudam nossos filhos a entender o que valorizamos, compreender suas raízes e a se sentirem parte de algo maior.
Uma tradição pode ser algo tão simples quanto compartilhar regularmente uma refeição em família, e ainda trazer inúmeros benefícios. Segundo uma pesquisa da Universidade de Harvard, crianças que jantam com a família têm uma alimentação mais saudável, menor risco de obesidade, melhores resultados escolares, maior bem-estar emocional e mais diálogo com os parentes.
Qual é a sua tradição familiar?
Olhando para a família que construí, vejo que já temos nossas tradições, que nasceram de forma orgânica. Uma delas é criar playlists do ano que estamos vivendo. Cada membro da família pode adicionar músicas que o marcaram em determinado momento daquele ano. No final do ano, escutamos juntos e vamos relembrando juntos o que aconteceu no decorrer do ano. Outra tradição é o café da manhã de domingo, que requer alguns pequenos rituais, como buscar o pão fresquinho na padaria, arrumar a mesa com direito a um pote de Nutella, preparar ovos feitos à moda do avô paterno e colocar a trilha sonora com músicas que nossos pais costumavam ouvir quando tínhamos a idade das nossas filhas.

Enquanto refletia sobre isso, percebi que, além dessas tradições orgânicas, existem outras tradições que ainda quero criar proativamente. Elas estão ligadas a valores importantes para mim e meu marido como gratidão, memória, e multiculturalismo. Na minha lista estão:
- uma celebração especial em um dia determinado do ano para lembrarmos dos amigos e familiares que já não estão aqui;
- escolher com minhas filhas, antes de dormir, ao menos uma coisa boa que aconteceu durante o dia;
- criar jantares temáticos (em que todos cozinhamos juntos) uma vez a cada três meses.
Que tal você também criar a sua tradição familiar? O primeiro passo é identificar os valores e interesses importantes para a sua família, começando por práticas simples e repetidas com consistência, como um jantar semanal ou uma celebração especial. O importante é que todos participem da escolha e ajudem a manter essa prática viva — assim, a tradição ganha um significado maior e todos se sentem parte dela. E aí, você já tem algumas ideias?









