Quadro de incentivo: vale a pena usar?
O reforço positivo pode ser útil em situações pontuais, como o desfralde (Foto: 123RF)
Um mural ou cartolina onde são anotados os deveres ou comportamentos esperados da criança, e no qual serão contabilizados os pontos ou estrelinhas que ela ganha ao cumprir essas obrigações. Esse é o quadro de incentivos, técnica que ficou famosa por ser usada no programa de TV Super Nanny (a versão brasileira é do SBT, mas existe desde 2004 no Reino Unido). É usado para estimular o bom comportamento, como no programa, mas também para recompensar a realização de tarefas ou até em situações mais pontuais, como desfralde.
Foi justamente para ajudar o filho mais velho nesse processo que Talita Catelan, mãe de Pedro e André, de 4 e 2 anos, respectivamente , adotou o recurso. Pedro tinha 3 anos e já avisava quando queria fazer xixi, mas nunca o cocô, e acabava sujando a calça. Talita procurou o apoio da escola e do pediatra, porém, já tinham se passado 3 meses e nada resolvia o problema. Foi quando ela leu sobre o quadro de incentivos em um grupo de mães do Facebook e o implementou em casa. “Dávamos uma carinha feliz para cada cocô que ele fazia no penico e, a cada três carinhas felizes, um brinquedinho ou um passeio”, conta Talita. Não funcionou de cara, demorou pouco mais de um mês. Um ano depois, ela aderiu ao quadro novamente, dessa vez para incentivar o menino, que nunca foi bom de garfo, a comer sozinho. E está dando resultado.
O quadro de incentivos costuma funcionar, mais cedo ou mais tarde, porque nada mais é do que um condicionamento por reforço positivo, já bastante conhecido da psicologia. “Cada comportamento desejado vai sendo reforçado pela recompensa. Como geralmente nossos atos não têm uma recompensa muito imediata, é difícil para a criança entender que é importante realizar tal ação. Então, o método torna isso mais concreto. Mas a criança tem que entender o que é esperado dela e, de fato, trabalhar para alcançar o objetivo e, assim, ter a recompensa”, explica a psicóloga Ana Carolina Faria, que já publicou um artigo a respeito das técnicas empregadas pela Super Nanny em um periódico da Associação Brasileira de Psicologia Social. Ela ressalta o caráter do tal prêmio para que o quadro tenha efeito. “Fazer birra até os pais cederem e comprar algo, por exemplo, é uma barganha, não uma recompensa. Tem que haver esforço em cumprir o objetivo proposto”, explica.
Ok, ele resolve. Mas outra questão a se considerar é: vale a pena usar? A pedagoga Silvia Zerbini, 35 anos, mãe de Maria, 7, e Manuela, 5 meses, pondera: “Tem horas que a situação fica muito difícil e que ele pode ajudar a solucionar uma questão pontual. No entanto, o problema é que se parece com o adestramento de um cachorro, ou seja, trata-se de um condicionamento. Só que, nós, seres humanos somos capazes de aprender. Ao ser condicionada, a criança não pensa sobre o porquê da regra”. No caso do desfralde, como em todos os outros, Silvia acredita que a mãe precisa entender o tamanho do desafio enfrentado pelo filho e ser parceira dele, sem ceder a pressões externas. “Se a criança tiver pronta, não vai ser tão difícil fazer o desfralde, por exemplo. E a grande recompensa para a criança será fazer xixi sozinha, não ficar molhada, livrar-se da fralda”, diz. Além de ensinar a criança o certo, vale explicar esses ganhos, com paciência. Ela ainda acrescenta: “Na minha opinião, técnicas desse tipo não são adequadas ou necessárias para qualquer criança. Elas são usadas para ajudar aquelas que nunca tiveram limites e pais que precisam recuperar a segurança e a autoridade (como acontece nos programas do estilo Super Nanny).
Mas é claro que há outras maneiras melhores de fazer com que o seu filho cumpra as responsabilidades dele, como conversar, dar exemplo e, principalmente, ser parceira na superação dos desafios. Isso porque, “ao atrelar as obrigações e desafios das crianças a recompensas, estamos estimulando o consumismo e desestimulando o altruísmo, que é fazer pelo bem do outro”. Ou seja, ele deve entender que não pode bater nos irmãos, por exemplo, porque a violência não é um meio de resolver conflitos – e não porque vai ganhar um brinquedo. O mesmo se aplica a lavar a louça, arrumar seus brinquedos, não jogar lixo na rua e por aí vai. “Para serem bons cidadãos, as crianças precisam aprender a cuidar de si para depois cuidar da casa, da cidade em que vivem e do nosso planeta”, conclui a pedagoga.