Os riscos da pirâmide de livros infantis
Você, certamente, recebeu um (ou vários) convite via redes sociais para participar de uma espécie de pirâmide de livros infantis nos últimos dias. A ideia é que o pai ou a mãe doe um livro para uma criança e convide mais seis amigos para participar. Ao final, o filho terá recebido 36 obras infantis. Caso tenha se animado com a proposta, vale refletir sobre os riscos envolvidos.
O primeiro deles é que, como se trata de uma pirâmide, uma hora a corrente poderá ser quebrada: além de uma criança frustrada, você terá de bancar o investimento inicial. Tanto que o esquema de pirâmide financeira, por exemplo, é considerado crime no Brasil com punição de até 2 anos de detenção.
Mas o mais grave, nesse caso, é o compartilhamento de dados pessoais da sua família na internet, como nome e idade da criança e endereço. O que pode ser arriscado, considerando-se que os amigos dos seus amigos também vão ter acesso aos mesmos. “Essas informações podem ser usadas por criminosos para ações como sequestros, assaltos e pedofilia, entre outros. Uma pessoa pode bater à porta da casa dizendo que está trazendo os livros da corrente e, uma vez que vocês os estão aguardando, até mesmo os adultos podem abri-la”, alerta Mariano Sumrell, diretor de marketing da AVG Brasil. Ele lembra que para recuperar senhas, por exemplo, as instituições financeiras fazem perguntas como o nome da mãe, a data de nascimento e o endereço para confirmar a identidade da pessoa do outro lado do telefone.
De fato, segundo o especialista, alguns dados pessoais podem mesmo ser encontrados na internet, já que, mesmo em operações corriqueiras como comprar pão, somos obrigados a fornecer mais informações do que desejamos. “Essa facilidade para obtê-las, porém, vai ser tanto maior quanto for o descuido com a proteção das mesmas”, conclui.
A jornalista e escritora de literatura para crianças Cristiane Rogerio, mãe de Clarice, 3 anos, também foi chamada para entrar na brincadeira. E, mesmo sendo apaixonada pelo tema, rejeitou o convite. Para ela, quantidade não se traduz necessariamente em qualidade. “A chance de ganhar livros que os pais considerem ruins é alta, porque se no começo a troca é entre amigos, depois inclui mais gente. E, mesmo com conhecidos, o risco existe”, afirma Cristiane, que também editora do site de cultura para crianças Esconderijos do Tempo. Literatura, afinal, é um conceito amplo que envolve gosto pessoal. Se você acha que ao ficar de fora dessa corrente está perdendo uma oportunidade de criar um pequeno leitor, a especialista dá um recado: incentivar a leitura vai além de comprar livros. “Exige dedicação do mediador, seja ele a família, o educador ou o contador de histórias”, diz.
Ainda que a pirâmide tenha boas intenções, uma alternativa seria montar um grupo fechado. “Que tal juntá-lo numa praça ou parque e todo mundo fazer uma leitura em voz alta para as crianças? E depois, quem sabe, pegar um livro de cada um (ou comprar um novo) e fazer uma doação em conjunto para alguma instituição que abrigue crianças ou um projeto de incentivo à leitura? Tem muita coisa bacana para fazer nesse sentido e conversar sobre elas é apenas o primeiro passo”, diz Cristiane.